América Latina e Caribe é região mais desigual do mundo, revela comissão da ONU

Ao longo da última década, a América Latina e Caribe alcançou seu menor índice de concentração de renda, mas a região continua sendo a mais desigual do mundo, com um coeficiente de Gini estimado em 0,5. É o que revela uma nova análise da comissão econômica das Nações Unidas para os 33 países latino-americanos e caribenhos, a CEPAL.
Lançado nesta segunda-feira (7/5), relatório avalia como disparidades afetam acesso a serviços e perpetuam exclusão. Segundo a pesquisa, Brasil tem pior taxa regional de conclusão do Ensino Fundamental II entre população mais pobre.
Ao longo da última década, a América Latina e Caribe alcançou seu menor índice de concentração de renda, mas a região continua sendo a mais desigual do mundo, com um coeficiente de Gini estimado em 0,5. É o que revela uma nova análise da comissão econômica das Nações Unidas para os 33 países latino-americanos e caribenhos, a CEPAL. Lançado nesta segunda-feira (7), relatório avalia como disparidades afetam acesso a serviços e perpetuam exclusão. Segundo a pesquisa, Brasil tem pior taxa regional de conclusão do Ensino Fundamental II entre população mais pobre.
O índice de Gini mede a diferença de renda entre as parcelas mais ricas e mais pobres de uma determinada população. Quanto mais próximo do zero, mais igualitária é a repartição de riquezas numa sociedade. Na África Subsaariana, a taxa é de 0,45. No Leste da Ásia e no Pacífico, o coeficiente chega a 0,4. Nos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), a 0,3.
Divulgada na semana em que acontece em Cuba o 37º Período de Sessões da CEPAL, a reunião bienal mais importante do organismo, a pesquisa denuncia a predominância na América Latina e no Caribe de um modelo fiscal em que grande parte da carga tributária é indireta e regressiva, recaindo principalmente sobre o consumo.
Na região, a cobrança direta de impostos sobre a renda é inferior à média de países da OCDE. Em 2014, a taxa efetiva de tributação sobre os salários dos 10% mais ricos foi calculada em 4,8%, ao passo que, em média, nos países da União Europeia, o índice foi estimado em 21,3%.
De acordo com o relatório, chamado “A Ineficiência da Desigualdade”, o sistema tributário expressa uma cultura regional de privilégios que reduz o potencial de ações fiscais diretas para a redistribuição de renda. Enquanto essas medidas contribuem para uma queda média de 3% no coeficiente de Gini latino-americano e caribenho, o fornecimento de serviços públicos de saúde e educação seria responsável por diminuir o índice em 6%. Nas nações europeias e em outros países da OCDE, o imposto de renda tem uma participação de 17% na redução da taxa.
“A economia política de sociedades altamente desiguais e a cultura do privilégio são obstáculos para avançar em um desenvolvimento com igualdade. A região herdou os vestígios coloniais de uma cultura do privilégio que naturaliza as hierarquias sociais e as enormes assimetrias de acesso aos frutos do progresso, a deliberação política e os ativos produtivos”, avalia Alicia Bárcena, secretária-executiva da CEPAL.
Outro problema é a evasão fiscal que, segundo a comissão, alcança valores de 6,7% de Produto Interno Bruto (PIB) regional, somente em imposto de renda e imposto sobre valor agregado.
Brasil tem pior taxa de conclusão do Ensino Fundamental II entre população mais pobre
A CEPAL também analisou a relação entre renda e educação. Na comparação com 16 países latino-americanos e caribenhos, a comissão mostra que o Brasil tem o menor índice de conclusão do Ensino Fundamental II entre os 20% mais pobres. A taxa chega a quase 35%, valor bem inferior ao verificado no Chile, onde o índice fica pouco abaixo dos 70%. O número chileno é muito próximo da proporção de brasileiros (71%) entre os 20% mais ricos que terminaram esse nível da educação formal. O levantamento comparou países como República Dominicana, Nicarágua, México, Honduras, Peru, Equador e Bolívia.
O relatório também aponta que a parcela da população brasileira que não concluiu o Ensino Fundamental II teria ganhos na renda de mais de 7,5%, caso chegasse ao final desse ciclo. Aumentos semelhantes foram identificados no Uruguai e na Bolívia. Na Argentina e Paraguai, as variações foram estimadas entre 10 e 12,5%.
Saneamento
As desigualdades financeiras também se traduzem no fornecimento de serviços de esgoto. Entre os 20% mais ricos da população brasileira, o acesso a saneamento é 18% maior do que entre os 20% mais pobres, segundo estatísticas de 2015. A disparidade é a sexta mais alta numa lista da CEPAL que reuniu dados de 17 países.
Enquanto na Guatemala e na Nicarágua, as variações chegam a 46 e 36% respectivamente, na Argentina e no Chile, as diferenças são inferiores a 2,5%.
Acesso à Internet
O relatório aborda ainda as disparidades no acesso à Internet. No Brasil, quem nasce nos domicílios que estão entre os 20% mais pobres do país têm quase cinco vezes menos chances de estar conectado. Em 2015, pouco mais de 15% das famílias dessa parcela da população tinham Internet em casa. Entre os 20% mais ricos da população brasileira, a proporção era de pouco mais de 70%.
O país fica atrás do Uruguai, onde quase 40% do segmento com menor renda tem acesso à rede; da Costa Rica, país no qual o mesmo índice chega a quase 45%; e do Chile, onde a taxa ultrapassa os 50%.
Quando avaliada a penetração da internet entre os 20% mais ricos, os três países alcançam taxas maiores que a brasileira, com o Chile caminhando para os 90%, a Costa Rica com mais de 80% de cobertura, e o Uruguai com quase 80% dessa faixa populacional tendo acesso a conexão.
Desigualdades raciais, de gênero e étnicas
No mesmo relatório, a CEPAL avaliou diferenças de renda entre a população branca e afrodescendente da América do Sul, bem como entre homens e mulheres. Em levantamento que analisou informações de Brasil, Equador, Peru e Uruguai, o organismo mostra que trabalhadores negros ganham menos que seus colegas brancos mesmo quando têm formação igual. As disparidades aumentam com o nível de educação formal.
Entre os profissionais com 12 anos ou mais de escolaridade, homens negros ganham em média pouco mais de 1,1 mil dólares, valor que representa cerca de 500 dólares a menos que os homens brancos. A mesma diferença foi identificada entre homens brancos e mulheres brancas, que ganham menos que seus colegas do sexo masculino. Na comparação com as mulheres negras, a diferença é ainda maior — homens brancos ganham cerca de 750 dólares a mais do que essas trabalhadoras. A moeda norte-americana foi usada como referência para comparar a realidade dos países pesquisados.
Na faixa dos oito a 11 anos de escolaridade, a variação salarial entre homens brancos e negros é menor — por volta de cem dólares —, com os afrodescendentes contabilizando rendimentos médios de 750 dólares. Contudo, permanece elevada entre gêneros distintos. Homens brancos têm salários mais altos que as mulheres brancas, ganhando de 200 a 300 dólares a mais que suas colegas. Entre homens brancos e mulheres negras, a disparidade ultrapassa os 350 dólares.
Entre brancos e a população indígena, também foram identificadas diferenças salariais significativas na Bolívia, Brasil, Chile, Equador, Guatemala, México, Nicarágua, Peru e Uruguai. Em média, nesses países, os homens brancos com 12 anos ou mais de escolaridade têm salários mensais estimados em quase 1,5 mil dólares. O valor é quase 450 dólares mais alto que os rendimentos de homens indígenas e mulheres brancas com a mesma formação e cerca de 500 dólares maior que os ganhos de mulheres indígenas.
Encarceramento da população negra no Brasil
A CEPAL também alerta para a presença desproporcional de negros no sistema carcerário do Brasil. Segundo a comissão, o número de pessoas privadas de liberdade cresceu 74% no país entre 2005 e 2012. O número de afrodescendentes presos é 1,5 vezes maior que o número de brancos.
Acesse o relatório “A Ineficiência da Desigualdade” na íntegra clicando aqui.